[ Por: Thalita Rebouças ]
— O senhor só pode estar de brincadeira!
— Não, você está muito bem. Não tem com o que se preocupar.
— Tem certeza?
— Absoluta.
— Arrã, arrã. Mas… E remédio? Não tem um remédio? Um antibiótico, um anti-inflamatório pra essa dorzinha na minha perna…
— Sua perna não tem nada, você trouxe sua ressonância, o raio-X e o laudo do seu ortopedista, eu vi, é só corrigir a postura mesmo. Não precisa de remédio pra nada.
— Mas eu sou ótima pra tomar remédio, sigo as recomendações da bula direitinho! O problema é começar a sentir os efeitos colaterais. Isso sempre acontece comigo. Mas qualquer coisa eu ligo, tá? Tenho seu celular e o telefone de casa.
— Thalita, relaxa, querida. Tá tudo bem.
— Mas não é possível! E exames? Que exames o senhor vai pedir pra mim?
— Nenhum exame.
— Nenhum exame? — repeti, exaltada. — Onde já se viu médico que não pede exame, doutor Armando? Pode pedir! Eu tenho plano!
— Você acabou de fazer um check-up completíssimo e todos os resultados estão ótimos. Sua saúde está perfeita.
— Nem um examezinho de sangue?
— Juntando as ampolas do check-up com o pedido da sua nutricionista, você colheu 32 ampolas de sangue, Thalita. Se tem um sangue analisado em laboratório, esse sangue é o seu.
— Então esquece sangue, esquece sangue! Que tal uma endoscopia, doutor? Eu queria tanto fazer uma… Nunca fiz, o senhor acredita? Tá mais que na hora, né?
— Imagina! Endoscopia é um exame chato, demorado, invasivo…
— Mas eu tiro de letra! Eu amo exames! E sou um espetáculo como paciente de exames. Pode perguntar pro meu otorrino, até de videolaringoscopia eu gosto, sabia? Acho bacana ver a minha faringe naquele monitor. Eu peço sempre pra fazer e quando ele topa eu fico quietinha, não reclamo, não chio…
— Mas você não precisa de exame nenhum agora.
— O senhor não ouviu que eu tive uma queimação na noite passada? Não é melhor fazer uma endoscopia pra descobrir logo o que tiver que ser descoberto?
— Não.
— Tem certeza?
— Tenho certeza de que não gosto de você perguntando se eu tenho certeza a cada dois minutos.
— Desculpa… Mas é que… eu achei que o senhor fosse me passar algum exame… Um examezinho só, que fosse…
— Tá bom!
Quase saltitei na cadeira. E quase morri quando vi o pedido: “Fezes e urina”.
Fezes e urina?! Quem esse médico pensa que é? Quer exame mais sem graça do que fezes e urina? Eu querendo fazer uma coisa mais complexa, mais séria, e ele receitando examezinho de criança. Mas é sempre assim. Médico, quando quer me dispensar, pede exame de fezes e urina pra eu parar de reclamar e ir logo embora.
Há alguns bons anos, marido, amigos e família insistem e me atacam ferozmente, condenam sem dó minhas atitudes, mas eu luto, digo que não, que é calúnia, que eles são loucos, que absurdo e blá-blá-blá. Mas a verdade é que os sinais se mostram cada vez mais evidentes e eu não tenho mais como negar. Sim, sou levemente (LEVEMENTE!!!) hipocondríaca.
Eu adoro médicos. Admiro médicos. Gosto de estar com médicos por perto. Sou uma pessoa que fica feliz quando chega a uma festa e alguém diz “aquele ali é médico”. Você não faz ideia, isso me dá um alívio, sobe uma felicidade no meu peito… Nem sei explicar. Casamento de médico, então, deve ser lindo. Só de me imaginar cercada por vários médicos de todas as especialidades já me faz sorrir extasiada. Seria a glória. Mas infelizmente não terei o prazer de viver essa experiência, os meus amigos médicos já são todos casados. Humpf!
Outro dia, vendo a entrevista de um médico no Sem Censura, tive a certeza absoluta de que tenho Hepatite B. Cansaço, dor no corpo, dor de cabeça, falta de apetite… Eu estava com todos os sintomas e confirmei minha suspeita com meu fiel escudeiro de todas as horas, o meu querido Dr. Google. O bastante pra tomar a decisão:
— Carlos, vamos fazer juntos exame de hepatite?
— A gente acabou de fazer check-up. Você não tem hepatite, está só gripada — respondeu meu marido, com a calma irritante que lhe é peculiar.
— Como você sabe? E se eu tiver hepatite? E se ela estiver encubada há anos?
— Você não tem hepatite. O nome disso é gripe. Vitamina C e cama.
— Ai, Carlos, por que tudo pra você é tão fácil?
— Porque eu não sou hipocondríaco.
— Nem eu!
Concordo, sou um pouco mais preocupada com a saúde do que as pessoas à minha volta. Gosto de ler livros sobre medicina (acabei de ler O Século dos Cirurgiões, que fala sobre as cirurgias antes da descoberta da anestesia. Poesia pura), de ir a médicos, de diagnosticar os amigos e familiares (sou boa nisso!), de me oferecer para acompanhá-los a consultas e sei, sim, o nome de alguns remédios, de anti-histamínicos a anti-inflamatórios. E também leio bulas frequentemente (existe um site de bulas, olha que paraíso!), não vejo mal nisso. Mas, ao contrário dos hipocondríacos clássicos, eu não me automedico. Nunca! Vai que eu fico doente me automedicando? Cruzes!
Outra coisa que me defende das acusações de hipocondria é o fato de eu só ter o telefone de um centro médico no meu celular. Um! Um só! Tudo bem, usei esse argumento ontem com a minha cunhada e achei superválido. O problema foi acordar hoje e sentir uma enorme necessidade de correr pra internet. Agora meu celular tem os telefones gerais e das emergências de quase todos os hospitais do Rio de Janeiro. Ufa!
O meu marido brinca dizendo que entro nas farmácias e pergunto ao atendente: “E aí, quais são as novidades da Bayer?”. Mas é mentira, nunca fiz isso! Tive vontade, mas juro que não fiz.
Ok, eu sou hipocondríaca. Não levemente, como disse acima. Totalmente.
Alguém aí conhece um remédio pra hipocondria?